Classificação de Risco Gestacional
Definição:
A gestação é um processo da vida que envolve mudanças dinâmicas na mulher em diversos contextos. Portanto, é indispensável a avaliação de risco permanente, em todo período da gestação e parto, evitando desfechos desfavoráveis (morbimortalidade materno-infantil) e oportunizando melhor a qualidade de vida à mulher.
Classificação de Risco1,2,3:
As gestantes que não apresentam patologias prévias ou associadas à gestação, bem como não apresentam alteração no desenvolvimento fetal, são classificadas como de baixo risco ou risco habitual.
No entanto, fatores de risco podem contribuir para que algumas gestantes apresentem maior probabilidade de evolução desfavorável. Essas mulheres são consideradas gestantes de alto risco.
Alguns ainda organizam a rede de assistência considerando gestantes de níveis intermediários de risco obstétrico, permitindo que a atenção primária continue acolhendo mulheres com menor potencial de complicação em conjunto com uma equipe multiprofissional, compartilhando o cuidado.
Os fatores de risco na gestante são aqueles que geram vulnerabilidade em todo o período da gestação, sejam físicos, biológicos, psíquicos ou sociais.
A identificação do risco deve ter início na primeira consulta de pré-natal e ser dinâmica e contínua, em que o risco da gestante será avaliado a cada consulta.
A avaliação e a classificação desses fatores permitem estabelecer um melhor cuidado e evitar maiores complicações. Conforme evidenciado pelo Ministério da Saúde, eles podem estar relacionados:
- A características individuais e às condições sociodemográficas desfavoráveis;
- À história reprodutiva anterior;
- À gravidez atual.
Estratificação de Risco e Proposta de Organização do Local de Assistência
Risco Habitual que permite a realização do pré-natal pela equipe de Atenção Primária à Saúde1,2,3:
- Idade entre 16 e 34 anos;
- Aceitação da gravidez;
- Ausência de intercorrências clínicas prévias à gestação ou na atual;
- Ausência de intercorrências obstétricas prévias à gestação ou na atual.
Risco intermediário que permite a realização do pré-natal pela Atenção Primária à Saúde com apoio da equipe multiprofissional ou com apoio de ambulatório pré-natal de alto risco1,2,3:
- Idade menor do que 15 e maior do que 35 anos;
- Ocupação: Esforço físico excessivo, carga horária extensa, rotatividade de horário, exposição a agentes físicos, químicos e biológicos, além de estresse;
- Situação conjugal insegura, autocuidado insuficiente, não aceitação da gravidez, apoio familiar insuficiente, principalmente, quando a mãe é adolescente;
- Indícios de violência doméstica ou gênero;
- Baixa escolaridade (menor do que cinco anos de estudo regular);
- Uso de medicamentos teratogênicos;
- Altura menor do que 1,45 m;
- Índice de Massa Corpórea (IMC) que evidencie baixo peso, sobrepeso ou obesidade (< 18,5 ou 30km/m2 a 39kg/m2);
- Transtorno depressivo ou de ansiedade leve sem necessidade de tratamento medicamentoso;
- Uso ocasional de drogas ilícitas;
- Etilismo sem indicativo de dependência;
- Tabagismo com baixo grau de dependência;
- Gestante negra ou em situação de rua ou em comunidade indígena, quilombola ou migrante;
- Abortos até 12 semanas em gestações anteriores (até 2 abortos consecutivos);
- Pré-eclâmpsia grave ou eclâmpsia em gestação anterior;
- Insuficiência istmo-cervical;
- (Suspeita de) Restrição de crescimento fetal ou macrossomia ou malformado;
- Diabetes gestacional;
- Infertilidade;
- Síndromes hemorrágicas ou hipertensivas sem critérios de gravidade;
- Intervalo entre partos menor do que dois anos;
- Nuliparidade e multiparidade (cinco ou mais partos);
- Duas ou mais cesarianas;
- Depressão e ansiedade leves sem uso de medicamentos;
- Asma controlada sem uso de medicamento;
- Hipotireoidismo subclínico diagnosticado na gestação;
- Gestação resultante de estupro;
- Gestação gemelar dicoriônica-diamniótica;
- Hipertensão gestacional ou pré-eclâmpsia sem sinal de gravidade para mãe e feto;
- Ganho de peso inadequado;
- Infecção urinária (até duas ocorrências ou 1 episódio de pielonefrite);
- Anemia leve a moderada (entre 9 a 11g/dL);
- Doenças infecciosas (sífilis, toxoplasmose aguda sem repercussão no feto e herpes simples);
- Suspeita ou confirmação de quadro febril com exantema (dengue, zica ou Chikungunya);
- Feto acima do percentil 90%.
Alto risco que permite a realização do pré-natal no ambulatório de alto risco ou especializado1,2:
- Cardiopatias;
- Pneumopatias graves;
- Nefropatias graves (como insuficiência renal crônica e rins policísticos);
- Endocrinopatias (hipotireoidismo clínico com medicamentos e hipertireoidismo);
- Diabetes gestacional em uso de insulina ou com repercussão do feto;
- Doenças hematológicas (exceto traço falcêmico);
- Doenças neurológicas;
- Neoplasias;
- Anemia grave (menor que 9mg/dL ou refratária ao tratamento);
- Doenças psiquiátricas que necessitam de acompanhamento;
- Doenças autoimunes;
- Transplantes;
- Cirurgia bariátrica;
- Infecção urinária de repetição baixa (3 ou mais episódios) ou 2 ou mais episódios de pielonefrite;
- Antecedente de tromboembolismo ou na gestação atual;
- Ginecopatias;
- Portadoras de doenças infecciosas (hepatites, toxoplasmose aguda com repercussão no feto, infecção pelo HIV/AIDS, sífilis terciária, hanseníase, tuberculose, sífilis terciária ou resistente ao tratamento ou com achados de sífilis congênita, rubéola, citomegalovírus);
- Etilismo com dependência;
- Tabagismo com dependência elevada;
- Dependência e/ou uso abusivo de drogas;
- Agravos alimentares ou nutricionais (IMC > ou = 40kg/m2, desnutrição, carências de nutrientes e transtornos alimentares);
- Gestação de homens transsexuais;
- Mola hidatiforme;
- Gestação gemelar monocoriônica ou multifetal ou por reprodução assistida;
- Morte intrauterina ou perinatal em gestação anterior, principalmente, se for de causa desconhecida;
- Pré-eclâmpsia grave ou síndrome HELLP ou de instalação precoce;
- Abortamento habitual/recorrente (mais de 3 consecutivos);
- Abortamento tardio ou morte perinatal explicada ou não;
- Isoimunização Rh em gestação anterior e atual;
- Cesariana prévia com incisão clássica/corporal/longitudinal;
- Trabalho de parto pré-termo inibido na atual gestação;
- Hemorragias na atual gestação;
- Placenta prévia (diagnóstico após 22 semanas);
- Acretismo placentário;
- Colestase gestacional;
- Restrição do crescimento intrauterino;
- Prematuridade na gestação anterior;
- Polidrâmnio ou oligoidrâmnio;
- Malformações fetais ou arritmia fetal;
- Insuficiência istmocervical na gestação atual;
- Qualquer patologia clínica que necessite de acompanhamento especializado;
- Condições de saúde de maior complexidade.
Situações clínicas de urgência/emergência obstétrica que requerem avaliação imediata em unidade hospitalar1,2:
- Vômitos incoercíveis não responsivos à terapêutica;
- Anemia grave (Hb ≤7 g/dL);
- Cefaleia intensa e súbita, sinais neurológicos, crise aguda de asma, edema agudo de pulmão;
- Crise hipertensiva (PA ≥160/110 mmHg);
- Sinais de eclâmpsia (escotomas cintilantes, cefaleia típica occipital, epigastralgia ou dor intensa no hipocôndrio direito com ou sem hipertensão arterial grave e/ou proteinúria);
- Eclâmpsia/convulsões;
- Temperatura axilar ≥37,8°C sem sinais ou sintomas de infecção das vias aéreas superiores;
- Suspeita de trombose venosa profunda;
- Suspeita/diagnóstico de abdome agudo;
- Suspeita/diagnóstico de pielonefrite, infecção ovular ou outra infecção que necessite de internação hospitalar;
- Prurido gestacional/icterícia;
- Hemorragias;
- Idade gestacional de 41 semanas ou mais.
Pré-natal de Risco Habitual1,2:
- A gestante deve ser atendida pela equipe de saúde de sua área de abrangência;
- Devem acontecer consultas alternadas pelo enfermeiro e pelo médico;
- Realize o pré-natal obedecendo a classificação de risco que deverá ser feita em todas as consultas;
- Oriente a gestante quanto à nutrição, ganho de peso e para eventuais atividades que possam gerar complicações;
- Acompanhe a gestante, realizando visitas mensais e marque futura consulta já na primeira semana do puerpério para a mãe e bebê;
- Atente-se para a saúde mental da gestante;
- Oriente sobre o preparo da mama para amamentação, se esse for o desejo da mulher (atenção aos casos em que há contraindicação).
Pré-natal de Risco Intermediário1,2:
- Pode ser acolhida pela equipe de saúde de sua área de abrangência em conjunto com um médico obstetra de uma unidade de pré-natal de risco intermediário;
- Além das consultas na unidade de origem, devem acontecer as visitas domiciliares;
- O foco da equipe deve ser em mitigar os fatores de risco e traçar estratégias de prevenção de agravos decorrentes dos fatores de risco;
- Fortalecer o autocuidado e apoio sociofamiliar.
Pré-natal de Alto Risco1,2:
- É necessário que a equipe assegure o atendimento ao pré-natal de alto risco, atentando-se para área de abrangência;
- Realize visitas domiciliares semanais ou quinzenais pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e equipe de saúde;
- Marque consultas alternadas entre os profissionais enfermeiro e médico;
- Em algumas situações, a gestante deverá ser atendida por equipe de saúde multiprofissional especializada, que pode variar de acordo com o território;
- Oriente quanto ao hospital de atendimento de referência de alto risco;
- Atente-se para os sinais e sintomas relativos as comorbidades;
- Atente-se para a saúde mental da gestante.
Diagnóstico de Enfermagem3:
- Risco aumentado de complicações gestacional;
- Risco diminuído de complicações gestacional;
- Risco de sangramento;
- Medo;
- Desconforto (náusea e/ou vômito).
Intervenções3:
- Estabelecer escuta ativa;
- Realizar a classificação de risco em todas as consultas;
- Atentar para a expressão não verbal da mulher;
- Orientar a gestante e seu acompanhante sobre a classificação de risco obstétrico e os cuidados necessários.
Autoria
Autor(a) principal: Enfermeiro Mestre Rafael Polakiewicz (Ciências em Cuidados da Saúde)
Doutorado em Ciências do Cuidado em Saúde (UFF) ⦁ Mestrado em Ciências do Cuidado em Saúde (UFF) ⦁ Especialista em Atenção Psicosocial e Dependência Química (FAFIA) ⦁ Bacharel e licenciado em Enfermagem (UFF) ⦁ Coordenador do Mestrado em Saúde Pública e professor do curso de Medicina, Enfermagem, Psicologia, Biomedicina e Educação Física do Centro Universitário UNIVERTIX
Revisoras:
Enfermeira Diana Gonçalves (Mestranda em Obstetrícia e Saúde da Mulher)
Enfermeira Obstétrica ⦁ Mestranda em Saúde da Mulher na EEAN/UFRJ ⦁ Criadora e administradora da página Mais Nascer (instagran:@maisnascer e facebook/maisnascer) ⦁ Graduada pela EEAN/UFRJ ⦁ Pós-graduada em obstetrícia na modalidade residência pela EEAN/UFRJ ⦁ Foi professora substituta no Departamento de Enfermagem Materno-Infantil na EEAN/UFRJ ⦁ Associada da Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras do Rio de Janeiro- ABENFO-RJ
Enfermeira Mestre Isabelle Gaspar (Saúde da Mulher e Sexualidade)
Enfermeira (EEAN / UFRJ) ⦁ Especialista em Saúde da Mulher (UFRJ) ⦁ Especialista em Gênero e Sexualidade (UERJ) ⦁ Mestre em Enfermagem (EEAN / UFRJ)
Enfermeira Camila Tenuto Messias da Fonseca
- Enfermeira (EEAAC/UFF) • Especialista em Terapia Intensiva (UNYLEYA) • Mestre em Ensino na Saúde (EEAAC/UFF) • Enfermeira rotina do CTI Geral (HUPE/UERJ) • Coordenadora do Programa de Residência de Enfermagem em Terapia Intensiva (HUPE/UERJ) • Membro do Departamento de Enfermagem (SOTIERJ) • Instagram: @camilatenuto ⦁ LinkedIn: Camila Tenuto (https://br.linkedin.com/in/camila-tenuto-ba1824299)
Referências:
1. Ministério da Saúde. Manual de Gestação de Alto risco [Internet]. 1ª edição. Brasília: Ministério da Saúde, 2022. Disponível: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2022/03/manual_gestacao_alto_risco.pdf Acessado em: 08 de abril de 2024.
2. Ministério da Saúde. Nota técnica para organização da rede de atenção à saúde com foco na atenção primária à saúde e na atenção ambulatorial especializada - Saúde da mulher na gestação, parto e puerpério [Internet]. São Paulo: Hospital Israelita Albert Einstein: Ministério da Saúde, 2019. Disponível em: https://www.as.saude.ms.gov.br/wp-content/uploads/2021/11/notatecnica_saude_mulher.pdf Acessado em 08 de abril de 2024.
3. Conselho Regional de Enfermagem. Protocolos de enfermagem na atenção primária à saúde: pré-natal de risco habitual [Internet]. Porto Alegre: Coren, 2024. Disponível em: https://www.portalcoren-rs.gov.br/docs/ProtocolosEnfermagem/ProtocoloEnfermagemPreNatalRiscoHabitual.pdf Acessado em 08 de abril de 2024.
PP-UNP-BRA-5014